O grupo da transição de governo para tratar de energia e mineração veio reforçado por uma equipe com muitos técnicos, o que foi interpretado como uma disposição do governo eleito em preparar terreno para enfrentar os novos debates que marcam essas áreas, como transição energética e eficiência ambiental.
A composição também reforçou a percepção no setor de que a terceira gestão de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) reserva uma vaga política para o comando do Ministério de Minas e Energia (MME).
O nome mais destacado no grupo é o de Mauricio Tolmasquim, que foi secretário-executivo do MME e presidente da Empresa de Planejamento Energético (EPE). A avaliação é que ele tem uma visão ampla, robusta e moderna sobre as demandas do setor, especialmente no segmento de energia elétrica. A maioria acredita que ele estará em algum posto no próximo mandato.
Outros indicados reconhecidos por seu conhecimento nessa área em particular são Nelson Hubner, que foi diretor-geral da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e Giles Azevedo, apontado como um dos maiores especialistas em energia do PT.
A presença de Robson Formica foi recebida como um detalhe peculiar. Integrante do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), ele seria uma voz de cunho mais social no que poderia ser a retomada do debate sobre como encaminhar a construção de novas hidrelétricas.
Há apenas um integrante com experiência mais consolidada no setor privado, Guto Quintela, que foi diretor global da Vale e sócio do BTG Pactual.
A preponderância de profissionais com atuação nas áreas sindical, de gestão pública e acadêmica não deixou dúvidas: o sinal é de mudança na gestão dessa área, de pró-setor privado para pró-Estado.
Isso também reforçou a expectativa em relação a uma possível reversão na privatização da Eletrobras. Apesar de onerosa e complexa, ela é defendida por alguns integrantes da coalizão que apoia Lula e tem inspirado preocupação da atual direção da ex-estatal.
Nessa nova ótica, existe uma expectativa em relação ao tratamento que será dado a questões hoje polêmicas, como a velocidade de abertura do mercado de energia elétrica, que foi colocada em discussão pelo atual governo, e o destino dos subsídios que recaem sobre a conta de luz, crescentes e onerosos para o custo da energia tanto em residências como empresas.
Os nomes também sinalizam a preocupação em ter um setor mais alinhado com renováveis. O ex-deputado Fernando Ferro é um exemplo. O parlamentar há mais de uma década olha para fontes renováveis, em Pernambuco.
A escolha dos integrantes com currículo consolidado na área de óleo e gás também agradou pela experiência e visão moderna, mas igualmente reforçou a ideia de mudança no foco na área, especialmente na gestão da Petrobras.
A estatal reduziu investimentos, faz privatizações, ampliou o pagamento de dividendos a acionistas e ainda não apresentou um plano mais amplo para atuar na transição energética, como foi feito pelas demais grandes petroleiras do mundo.
Há grande expectativa em relação a política de preços dos combustíveis na nova gestão Lula, bem como será conduzido o novo ciclo de investimentos da estatal, que nos últimos anos focou na exploração do pré-sal.
O próprio Lula, no entanto, questiona o que chama de dolarização do preço dos combustíveis e também anunciou a intenção de retomar a expansão das refinarias, ainda que o setor de óleo e gás tenda a perder espaço na transição energética.
Entre os integrantes do grupo estão especialistas com uma visão moderna, caso do senador pelo PT Jean Paul Prates. Apesar da longa trajetória em óleo e gás, ele se estabeleceu como um legislador em favor das renováveis. Neste momento, está na COP 27, acompanhando os debates das mudanças climáticas e as falas de Lula.
Prates tem sido nome recorrente para ocupar algum cargo no próximo governo. Já foi citado para comandar o ministério ou a Petrobras.
Outra integrante do grupo de transição que também foi cogitada é Magda Chambriend. Ela já comandou a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) e o setor receberia bem a indicação de uma mulher para o posto, que costuma ser reservado à presença masculina.
Entre os especialistas em energia, ninguém entendeu muito bem a presença de Anderson Adauto, ministro dos Transportes de 2003 a 2004, no distante primeiro mandato de Lula. A leitura foi que sua indicação busca equilibrar a balança política.
Adauto atualmente é do PCdoB, que integra a coalizão de apoiou Lula, mas olhando pelo aspecto partidário, a maior parte dos indicados para esse grupo de transição é alinhada ao PT, com destaque para profissionais que atuaram com Dilma Rousseff, tanto quando ela esteve no ministério quanto na Presidência.
Ampliando essa leitura política, a percepção no mercado é que o ministro não está no grupo da transição.
Essa pasta foi, em inúmeros casos, ocupada por um político amparado por técnicos qualificados. Diante da necessidade de fazer alianças partidárias para ampliar a interlocução com Câmara e Senado, a leitura geral é que Lula vai colocar na cadeira do MME algum indicado por partidos mais de centro-direita, como MDB e PSD, ou mesmo algum integrante da base do Centrão.
Um dos nomes que circularam mais recentemente foi o do ex-governador de Alagoas, Renan Calheiros Filho (MDB). Seu pai, o senador Renan Calheiros (MDB-AL), apoia Lula, mas há certa insatisfação na família em ver Lula buscando aliança com um de seus desafetos, o presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL). Um ministério poderia aplacar o descontentamento e fortalecer laços políticos.
Também circularam no mercado nomes como o do senador Eduardo Braga (MDB).
A leitura, no entanto, é que Lula ainda não bateu o martelo, pois precisa resolver o quebra-cabeça político antes. A Folha consultou representantes de todos os segmentos do setor, que preferiram não ter os nomes citados nessa primeira fase da transição.
Quem é quem no grupo de transição de Minas e Energia
- Anderson Adauto: Ministro dos Transportes de 2003 a 2004, durante o primeiro mandato de Lula; prefeito de Uberaba por dois mandatos, de 2005 a 2012; e deputado estadual em Minas Gerais por 16 anos, de 1987 a 2003. Já passou por vários partidos, como MDB, PL e Republicanos, mas atualmente está no PCdoB.
- David Barcelar: Petroleiro graduado em administração, com especializações em gestão de pessoas. É coordenador-geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP) e foi representante dos trabalhadores no conselho de administração da Petrobras (2015-2016).
- Fernando Ferro: Engenheiro especializado em sistemas elétricos e ex-deputado federal por Pernambuco (PT).
- Giles Azevedo: Geólogo e ex-chefe de gabinete do MME. Foi assessor especial da presidente Dilma Rousseff.
- Guto Quintela: Agrônomo de formação, empresário do agronegócio e membro do conselho diretor do Centro de Empreendedorismo da Amazônia. Foi diretor global da Vale e sócio do BTG Pactual.
- Ikaro Chaves: Engenheiro eletricista da Eletronorte e diretor da Associação dos Engenheiros e Técnicos do Sistema Eletrobras.
- Jean Paul Prates: Advogado e economista. É senador do PT pelo Rio Grande do Norte e presidente do Sindicato das Empresas do Setor Energético do mesmo estado.
- Magda Chambriard: Mestre em engenharia química pela Coppe-UFRJ e engenheira civil pela UFRJ, é coordenadora de pesquisa na FGV Energia. Foi diretora- geral da ANP.
- Mauricio Tolmasquim: Engenheiro de produção, é professor titular da Coppe-UFRJ. Foi secretário-executivo e ministro interino do MME no governo Lula e presidente da EPE.
- Nelson Hubner: Engenheiro, atua na área de energia. Foi secretário executivo e ministro interino do MME. Foi, também, diretor-geral da Aneel e presidente do conselho de administração da Light.
- Robson Sebastian Formica: Especialista em energia e sociedade. Integra a coordenação nacional do MAB.
- William Nozaki: Professor de economia em São Paulo e diretor do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (Ineep).
Alexa Salomão
FONTE: NOVACANA